NÃO AO DESPERDÍCIO!
18
de Maio 2004 -
Numa
viagem de dois anos a Marte, segundo uma
estimativa, uma tripulação de 6 humanos
produziria mais de 6 toneladas de resíduos
sólidos orgânicos – sendo na sua maioria
fezes. Então o que fazer com tudo isso?
Presentemente, os
resíduos dos astronautas são recambiados de
volta para a Terra. Mas numa exploração de
longa duração, gostaríamos de reciclar isso,
porque contém recursos de que os astronautas
precisarão. Fornecerá água potável.
Disponibilizará fertilizantes. E, com o
auxílio de um microorganismo recentemente
descoberto, fornecerá electricidade.
Como muitas
bactérias, esta, um membro da família
Geobacteraceae, alimenta-se de, e pode
decompor, material orgânico. Os
microorganismos Geobacter foram primeiro
descobertos na lama poluída do rio Potomac
em 1987; eles gostam de viver em locais onde
não há oxigénio e há abundante ferro. Eles
também têm a inesperada capacidade de
transferir electrões para o metal. Isto
significa que, sob condições ideais, os
microorganismos Geobacter podem, em
simultâneo, processar resíduos e gerar
electricidade.
Acima:
Uma fotomicrografia de
Geobacter
metallidreducens.
As "condições ideais" podem ser encontradas
num novo tipo de célula de combustível – uma
célula de combustível microbiana membranar.
Este dispositivo está actualmente a ser
desenvolvido por uma equipa de investigação
liderada por
Bruce Rittmann, um professor da Universidade
de Northwestern, e financiada pela NASA.
Todas as
células de combustível geram electricidade
ao produzir e controlar um fluxo de
electrões. Células convencionais, incluindo
as utilizadas a bordo do vaivém espacial e
em alguns protótipos automóveis, obtêm os
electrões para o fluxo de electrões ao
extraí-los dos átomos de hidrogénio. Para
fazer isso, estas células têm de receber um
fornecimento constante de hidrogénio.
As células de
combustível microbianas, por sua vez, obtêm
os seus electrões a partir de resíduos
orgânicos. As bactérias no interior do
dispositivo alimentam-se dos resíduos, e,
como parte dos seus processos digestivos,
elas extraem electrões do material residual.
Os microorganismos Geobacter, assim
como uns poucos tipos diferentes desse
género, podem ser induzidos a transmitir
estes electrões directamente para um
eléctrodo da célula de combustível, que os
conduz para um circuito - um fio, por
exemplo. Ao fluírem através do circuito,
eles geram electricidade.
As células de
combustível microbianas já foram
experimentadas na Terra. Por exemplo, um
protótipo está a ser usado na Universidade
do estado da Pensilvânia para gerar
electricidade enquanto purifica a água de
despejos domésticos.
"Para tornar
esta ideia prática para a viagem espacial,
diz Rittmam, é preciso ter "uma configuração
muito eficiente e compacta". A célula de
combustível não pode ocupar muito espaço .
Para satisfazer esta condição, Rittman
está a considerar uma célula de combustível
de fibras altamente compactadas, sendo cada
uma delas, em si mesma, uma célula de
combustível.
Esquerda:
Numa
célula de combustível convencional, tal como
é mostrada aqui, os electrões extraídos do
hidrogénio fluem através de um circuito e
realizam trabalho, ou seja, acendem uma
lâmpada. Numa célula de combustível
microbiana membranar os electrões são
extraídos dos resíduos humanos.
Cada fibra
consistiria de três camadas, como três
palhas, umas dentro das outras. Cada camada
corresponde a uma das camadas da célula de
combustível: o ânodo (exterior), a
membrana-electrólito (meio) e o cátodo
(interior). Uma nuvem de resíduo liquefeito
seria bombeado através das camadas
exteriores onde os microorganismos
Geobacter (ou outras bactérias
similares) podem captar electrões e
deslocá-los em direcção ao ânodo, para o
circuito, e depois para o cátodo.
Antes de tais
projectos poderem ser postos em prática,
contudo, Rittman e a sua equipa devem
primeiro decifrar o mecanismo preciso pelo
qual a bactéria transfere electrões para o
eléctrodo. Até agora em testes
laboratoriais, a velocidade de transferência
é muito lenta. "Precisamos de saber como
torná-la mais rápida," diz Rittman, "e assim
gerar mais energia ."
Ele tem uma
série de ideias acerca de qual possa ser o
obstáculo. "O electrão, na realidade, tem de
mover-se da superfície exterior do
microorganismo para o eléctrodo, e pode
acontecer que isso seja limitado." Mesmo se
a bactéria vive agarrada à superfície do
ânodo, na verdade, só uma pequena parte da
bactéria toca o metal, e isso pode estar a
impedir o movimento de electrões.
Outro factor
está relacionado com a voltagem no
eléctrodo. Tem de ser suficientemente
elevada para induzir os microorganismos a
libertarem os seus electrões. "Os
microorganismos deslocam electrões a fim de
obter energia. De facto, eles só deslocam os
electrões quando ganham energia," explica.
Qual a melhor voltagem? "Essa é uma das
questões que estamos a tentar responder."
Direita:
Bruce E.
Rittmann é professor John Evans de
Engenharia Ambiental
na
Universidade de Northwestern.
"Suponhamos,
por exemplo, que a diferença da voltagem
total entre a célula de combustível e o
ânodo é 2 V (volt). Então os
microorganismos, quando libertam os seus
electrões, têm de retirar 0,5 V para seu
próprio sustento, deixando 1,5 V para
executar trabalho no circuito. Estes são
apenas números imaginados," diz Rittman,
"mas ilustram o que estamos a tentar
aprender."
A célula de
combustível microbiana membranar
encontra-se ainda nas fases iniciais do seu
desenvolvimento. Contudo, se o projecto
tiver sucesso, poderemos encontrar estes
aparelhos não só no espaço, mas também nas
nossas próprias casas. Ao fim e ao cabo, os
astronautas não são os únicos que produzem
resíduos orgânicos.
"Tem de lidar
com os resíduos de qualquer maneira," aponta
Rittman. "Então por que não fazer do processo
um ganho de energia em vez de uma perda de
energia? Ao produzir electricidade, as
células de combustível tornariam o processo
de purificação de fluxos de água residuais
muito mais económicos.
Além disso,
diz Rittman, "elas mudam o nosso ponto de
vista. As células de combustível microbianas
transformam algo que consideramos
indesejável, num recurso."
Desperdício?
Talvez não.
LINKS |
NASA's Office of Physical and Biological
Research - conduz investigação
interdisciplinar, revista por outros
cientistas, fundamental e aplicada para
ir ao encontro das oportunidades e
desafios da NASA que são fornecidos pelo
ambiente do espaço e exploração humana
do espaço.
Rust-Breathing Bacteria: Miracle
Microbes? da National
Geographic. O género bacteriano
Geobacter vive da ferrugem, purifica
a água de nascente poluída, gera
electricidade, e pode conter pistas para
as origens da Vida.
The Geobacter Project da UMass
Amherst. Página oficial.
Bruce E. Rittmann - Bruce E.
Rittmann é professor John Evans de
Engenharia Ambiental na Universidade de
Northwestern.
Cool Fuel Cells da Science@NASA.
As células de combustível prometem ser
uma fonte de energia amiga do ambiente,
mas alguns tipos funcionam a
temperaturas demasiado altas.
Investigação financiada pela NASA pode
ter uma solução.
How Fuel Cells Work da
HowStuffWorks.com.
Solid Waste Management in Space
da JSC. Uma lista parcial de projectos
de gestão de resíduos sólidos
financiados pela NASA estão a ser
desenvolvidos para missões espaciais de
curta duração e longa duração.
Mars Missions Solid Waste Model
da JSC.
Water on the Space Station da
Science@NASA. Racionar e reciclar será
uma parte essencial da vida da ISS.
Neste artigo, a Science@NASA explora
onde futuras tripulações obterão a água
e como a (re)utilizarão.
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