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O MUNDO NUM GRÃO DE POEIRA

 

31 de Dezembro 2003 - Desde há muito tempo que os filósofos se têm esforçado por "ver um mundo num grão de areia", como disse William Blake. Agora os cientistas estão a tentar perceber o Sistema Solar num grão de poeira, isto é, poeira cometária.

 

Acima: Um desenho artístico da sonda Stardust a aproximar-se do cometa Wild 2.

 

Se tudo correr bem, a sonda Stardust, da NASA, será a primeira de sempre a transportar, no seu regresso à Terra, material de um cometa, para os cientistas examinarem.  Seria também a primeira vez que qualquer material seria deliberadamente trazido para a Terra, do espaço profundo.

 

E não é mera poesia dizer que naqueles grãos pequenos de poeira cometária se podem descobrir as pistas da origem da Terra e talvez o começo da própria Vida.

 

Os cometas são como cápsulas congeladas do tempo em que o nosso Sistema Solar se formou. Deslocando-se no frígido Sistema Solar exterior durante milhares de milhões de anos, estas "bolas de neve sujas" do tamanho de asteróides sofreram poucas mudanças relativamente aos planetas mais dinâmicos. Olhar para os cometas é um pouco como estudar os restos de massa na taça de uma batedeira para perceber como se chegou a um bolo de noiva.
 

Na verdade, evidência sugere que os cometas podem ter desempenhado um papel no aparecimento da Vida no nosso planeta. O constante bombardeamento da jovem Terra por cometas gelados ao longo de milhões de anos trouxe alguma água que torna azul o nosso acastanhado planeta. E os cometas contêm compostos de carbono complexos que podem ser os blocos construtores da Vida.

 

Lançado em 1999, Stardust fará um encontro com o cometa Wild 2 (pronunciado Vilt em memória do descobridor suiço) a 2 de Janeiro de 2004. Um encontro com um cometa é como um encontro com uma metralhadora, numa noite de nevoeiro. Quando a Stardust mergulhar sobre as nuvens de gás que envolvem o núcleo do Wild 2, os grãos de poeira passarão por ela a uma velocidade de 21 000 km/h, ou seja, seis vezes mais rápido que uma bala disparada de uma pistola. Os "olhos" da Stardust, uma câmara a bordo, irão espiar, a partir da cápsula, através de um periscópio, para evitar danos. Um escudo Whipple - um conjunto de cinco folhas de filamento carbono e revestimento cerâmico cada um separado cerca de 5 cm - protege o resto da sonda.

 

Stardust usará um material chamado aerogel para captar alguns dos velozes grãos. O aerogel é um sólido semelhante a espuma, tão ténue que, mesmo no interior, 99% do seu volume é ar. A leveza etérea do aerogel minimiza os danos nos grãos quando são capturados. Os organizadores da missão esperam capturar, no aerogel, mais de um milhar de grãos maiores que 15 microns.

 

Esquerda: Partículas de elevada velocidade capturadas por aerogel deixam vestígios em forma de cenoura.

 

Wild-2 orbitava o Sol além de Júpiter até 1974, quando ele foi arrastado pela gravidade de Júpiter numa órbita de aproximação ao Sol - dentro do alcance das sondas da Terra. Desde então o cometa passou próximo do Sol somente 5 vezes e, por isso, o seu gelo e poeira devem ter sido pouco alterados pelo calor do Sol. A poeira primitiva do Wild 2 pode mostrar-nos como era o sistema solar antes de ser cozinhado por 4,5 mil milhões de anos de luz solar e radiação.

      

Após o encontro, a sonda Stardust fará um volta em torno do Sol numa jornada de dois anos de regresso à Terra. Em Janeiro de 2006, de volta a casa outra vez, a sonda ejectará a Sample Return Capsule que  parece uma cápsula Apollo em miniatura. A SRC usará pára-quedas e, se tudo correr como planeado, aterrará em Utah onde os cientistas estão à espera...

 

To see a world in a grain of sand
And a heaven in a wild flower
Hold infinity in the palm of your hand
And eternity in an hour

 

William Blake (de Auguries of Innocence, circa 1800)

 

LINKS

 

STARDUST  da JPL.

 

 

 

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