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Observação 28/10/2002   09/11/2002   Observação 11/01/2003

 

 

 

 

    Local: Vila Nova de São Bento - 37,9170º N - 7,4170º O. Na primeira parte da observação - No interior da vila... nas traseiras da casa. Na segunda parte da observação - Junto ao cemitério...

 

     Data: 9 de Novembro 2002

 

     Hora: 18 h 30 min - 19 h 30 min UTC  e  22 h 00 min - 22 h 30 min UT

 

     Magnitude zenital: por volta de 13,5 no dobsoniano BrighStar modelo SpaceWalker 8" (20 cm)

 

     Condições luminosas: Na primeira parte da observação - Postes de iluminação a Sudoeste do pátio. Na segunda parte da observação - Parca poluição luminosa a Sul, e poluição luminosa proveniente dos faróis de carros (raro).

 

     Condições atmosféricas: Antoniadi II. Céu transparente e estável. Boas condições, no mínimo. Na segunda parte da observação - Muita humidade.

 

     Condições locais: Na primeira parte da observação - Obstrução do horizonte para Norte, Oeste e Sudoeste. Acessível só a partir de Este, Sudeste e Sul. Na segunda parte da observação - Obstrução parcial na direcção Sudoeste pela igreja, de resto horizonte desimpedido.

 

     Temperatura: 8 ºC

 

    Equipamento: Telescópio dobsoniano com montagem altazimutal (simplificada) da BrightStar (modelo SpaceWalker) f/6 de  8" (200 mm = 20 cm) com Quickfinder; ocular Plössl 25 mm; ocular Plössl 9 mm; livro "Observar o céu profundo" de Guilherme de Almeida e Pedro Ré; Sky Atlas 2000.0 Field Edition de Wil Tirion e Roger W. Sinnott;  cadeira de cozinha...

 

    Técnicas utilizadas: Visão lateral, método de localização " de estrela em estrela" – as habituais.

 

 

     Convido-vos a ler este enorme texto. O presente relato é muito forte em termos emocionais. Não aconselho a leitura para os mais sensíveis. :)))  Na noite de Sábado, dia 9 de Novembro de 2002, efectuei mais uma observação repartida por duas partes. A primeira teve lugar no pátio da casa (Vila Nova de São Bento)... e a segunda... junto ao cemitério (nos arredores de Vila Nova de São Bento - cerca de 1 km)... Foi de facto uma noite fantasmagórica e mádida... A primeira teve como alvo preferencial a Lua. A segunda parte da observação constituiu um grande risco pessoal. Desloquei-me sozinho para um sítio ermo. Tenho consciência que é muito perigoso mas o entusiasmo era muito forte. Tanto que apesar de a minha mulher, muito preocupada comigo, insistir por várias vezes para não ir... (mesmo assim) acabei por ir observar um céu daqueles. No entanto, acedi em ficar só por uma hora a observar e levar os dois telemóveis... O local é percorrido a 200 metros por uma estrada da qual passam pouquíssimos carros, a Sul nota-se a parca poluição luminosa de Vila Nova de São Bento. De resto não há qualquer outro tipo de fonte de poluição luminosa. O céu virado para Norte, Este e parte de Oeste é magnífico. Vê-se a galáxia do Triângulo a olho nu. É claramente um local de classe 3 (segundo a lista que o nosso colega Luís Carreira enviou para a lista). Um pouco mais a Norte há locais com classe 2. Neste céu a ocular presenteava-me com estrelas bem mais pálidas do que com as quais estou habituado a ver. Vi estrelas de magnitude 13-13,5. Portanto não é difícil imaginar a miríade de pontos luminosos que perpassavam na ocular.

 

     O querer gemer com o céu é vir observar onde estive. O querer sentir-se parte do céu é vir observar para este céu ínclito. O querer sentir que fazemos parte de algo grandioso que nos esmaga é vir ao sítio onde marquei presença. A certa altura na direcção de Cygnus a minha mente imbuiu-se com as estrelas. Inebria-me céu! Se não houvesse céu, ou para quem já o céu não tem significado, a vida seria/á muito mais triste. Mesmo para aqueles a quem pensam que a vida material lhes preenche o vazio e nada mais interessa. Isso é vã e pura ilusão! Mas o céu está sempre a acompanhar-nos seja como for. É um conforto saber isso. É reconfortante. Foi numa altura menos boa que me agarrei ao céu o qual me deu alento e conforto. Continuo e continuarei a respeitá-lo e acima de tudo a admirá-lo. Lembrem-se que o céu já foi muito mais importante para os humanos. Basta olhar para os nossos longínquos ascendentes. Vem maravilhosamente descrita os sentimentos e os pensamentos de um homem das cavernas, um iluminado, acerca do céu na bela obra poética COSMOS do saudoso Carl Sagan (das melhores que tenho lido). OLHAR PARA O CÉU É UM ACTO SUPREMO DA NATUREZA. É o que eu penso. É tudo o que resume o eterno fascínio que sinto lhanamente pelo firmamento estelar. E para os caros amigos/as que estão a ler estes excertos de um "louco" :)) pelo céu, que pensam quando olham para o céu? Sim, vocês...

 

     Aqui é adequado incluir uma frase que dois astrónomos que solicitaram para colocar no seu epitáfio... Amámos demasiado as estrelas para recearmos a noite. Pois que a luz nos dá o conhecimento, nos ilumina, nos inebria e protege-nos do medo, da ignorância, do preconceito, da escuridão, da noite. A noite foi fantasmagórica pois foi algo estranho estar a observar perto de um local cheio de pessoas que já não respiram, já não sentem... Para que não fiquem com uma ideia errada: de maneira nenhuma sou um mórbido. Foi uma hipótese de local para poder ter um céu digno de se observar.

 

     Noite mádida pois que a humidade foi atroz e embaciou o buscador e oculares em meia hora de observação. Agora é altura de passar à descrição do que foi observado durante a noite.

 

 

     Observação efectuada entre as 18 h 30 min e as 19 h 30 min UT:

 

   Aqui a Lua foi o alvo... É curioso como a Lua é tão esquecida pelos astrónomos amadores. É paradoxal que, apesar de ter sido uma das "responsáveis" que iniciou muitos astrónomos neste mundo da Astronomia, seja esquecida depois de iniciarem o estudo do céu. Talvez por perturbar a observação de objectos do céu profundo que parece mostrar um maior desafio na sua procura e detecção. Talvez por parecer algo monótona a observação de uma cratera, e mais outra... tal deve-se a um gritante desconhecimento do que se está realmente a observar. Vou tentar, modestamente, recriar e incentivar o gosto pela observação da Lua. Este satélite natural encerra muito mais segredos do que se possa pensar. É preciso explorá-la. Por isso vamos descolar e partir em direcção ao corpo que dança com o pequeno ponto azul desde aquela provável colisão de um asteróide do tamanho mais pequeno que o planeta Marte de  com a Terra que o originou. Cintos apertados? Vamos alunar e iniciar a aventura! Hoje estive alunado no Mare Tranquilitatis = mar da Tranquilidade e passei perto de Lacus Temporis = Lago do Tempo (que belíssimo e poético nome! fez-me lembrar um pouco um quadro do excêntrico Salvador Dali...) onde observei a cratera ATLAS (no quadrante Nordeste da Lua). Recordo-me de um pico central brilhante mas não muito saliente. A cratera Atlas conjuntamente com a parceira cratera Hercules constitui um dos pares mais curiosos que se pode observar na Lua. Atlas possui cerca de 89 km de diâmetro, o equivalente entre a distância entre Válega e Coimbra. :) As paredes que revestem a cratera variam entre 2750 m e 3500 m de altura! Bem maiores do que a Serra da Estrela... Aliás se pensarmos nas dimensões relativas da Lua e da Terra, ainda ficaremos MAIS assombrados por tamanhas altitudes. Em comparação, essas altitudes na Lua, aqui equivaleriam a uma altitude bem MAIOR do que a do monte EVERESTE! Portanto, vejam que a Lua tem formações bem mais imponentes relativamente às da Terra. E o modo de formação dessas montanhas obviamente é diferente das que temos cá na Terra. Na Lua, não há indícios de tectónica de placas. A maioria dessas cadeias montanhosas da Lua resultaram de um impacto de um asteróide / cometa contra a sua superfície. Continuando... Por curiosidade, Atlas, segundo a mitologia grega, era um titã. Atlas, após a derrota dos titãs, foi condenado por Zeus a suportar o céu na extremidade Oeste do mundo. O nome Oceano Atlântico deriva do seu nome. Não vou incluir todas as formações observadas pois foram muitas as que observei pelo que só destacarei algumas. Entre elas chamou-me à atenção a cratera situada a Oeste da cratera Atlas: cratera Chevallier. Uma cratera desintegrada, na qual a mais pequena estava na mais completa escuridão. Outra do mesmo género é a cratera de Hall situada a sul da cratera Atlas. Aqui apreciei a enorme parede projectada na superfície lunar. Uma imagem assombrosa. Outra visita teve passagem pelo Mare Fecundidatis = mar da Fecundidade onde existe a cratera do grande MAGALHÃES - o famoso navegador português que efectuou a primeira circum-navegação. Trata-se de uma cratera com uma superfície muito escura não evidenciando qualquer pico central, cujas paredes parecem ser contínuas.

 

 

     Observação efectuada entre as 22 h 00 min e as 22 h 30 min UT:

 

     A visão que tive da galáxia do Escultor = NGC 253 = PGC 2789 = ESO 474-29 = MCG -4-3-9 = UGCA 13 foi a melhor que já pude ter a oportunidade de observar. Via-se perfeitamente a galáxia de perfil em todo o seu esplendor, na ocular Plössl de 25 mm. No quadrante seguidor Sul = south following (considerando a imagem invertida que se tem da ocular) eram visíveis duas estrelas de magnitude aproximada de 9. No interior da galáxia, era visível um núcleo brilhante e algumas estrelas muito ténues. No buscador 9x50 era possível ver uma mancha esbatida da galáxia por visão directa. Outro objecto que me cativou nesta noite fantasmagórica foi o enxame Fantasma = NGC 7789 = OCL 269. Trata-se de um enxame estelar aberto. Parece desaparecer por vezes na ocular daí o seu nome Fantasma. Parece um fino véu de estrelas que esvoaça ao sabor do vento estelar... Visíveis centenas de estrelas que faz estranhar um pouco dada a sua natureza de enxame aberto. Confunde-se por vezes com um enxame globular. A sua localização é fácil, mas a sua detecção é um pouco mais complicada já que os céus escuros não abundam por aí e estes ajudam a criar um maior contraste. Tentei procurar por NGC 891 que é uma galáxia com brilho superficial muito baixo e com magnitude integrada aproximada de 13, mas ainda não consegui apontar para o dito objecto. Terá de ficar para uma outra noite. Uma das observações que me captou a atenção foi a provável observação da Nebulosa da Hélice = NGC 7293 = PK 36-57.1 = ESO 602-PN22  (?) por visão lateral no buscador 9x50. Vislumbrei uma forma circular muito atenuada com um relativo enorme diâmetro aparente. Mas houve uma visão inesquecível das, que eu considero ser, jóias mais belas que temos no Hemisfério Norte: o duplo enxame de Perseus = NGC 884 / NGC 869. Dava ao céu outro ar. Um olhar atento na ocular Plössl 25 mm e ficava siderado por tão rico enxame de estrelas!!! E, como que a segurar o enxame, havia um colar de estrelas que nos indicava o caminho em direcção à Cassiopeia. No fim deste colar, vislumbrei o já visto Stock 2 - enxame estelar aberto.

 

     Para se poder apreciar melhor o enxame duplo usei o buscador pois o seu campo de visão é maior do que o que nos mostra o telescópio. Apontei o telescópio para a famosa Nebulosa América do Norte = NGC 7000 em Cygnus, mas, neste caso não sei se consegui ver... o que vejo são zonas de maior luminosidade contrastadas com zonas de baixa luminosidade, mas nada de contornos de um "continente" nebuloso. Num telescópio dobsoniano 8" sem qualquer filtro num céu razoavelmente escuro que se poderá ver numa ocular Plössl de 25 mm? Além destes objectos, percorri os céus para ver M15 e M2.

 

     Apontei já no final da sessão, que demorou só meia hora devido à intensa humidade que se fazia sentir, para a estrela dupla Polaris e a 49ª estrela mais brilhante do céu e para Saturno. Infelizmente já não deu para poder observar pormenores do planeta em voga pois a humidade não dava espaço para mais observação.

 

 

 

 

 

 

 

 

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