Mais uma grande noite de convívio na Atalaia, apesar da morte anunciada do já não muito abundante céu escuro. Logo tinham de plantar um aeroporto internacional a 500 metros de nós. As ameaçadoras imagens de satélite não fizeram vacilar os muitos que por lá estiveram, e para quem, deu como bem empregue o tempo, que foi para mim o mais curto que por lá passei, tudo graças às nuvens que começaram a surgir a pouco e pouco a partir da meia-noite. Houve muita humidade, com a temperatura a rondar os 5 graus, com as oculares a embaciar só de olhar por elas, mas para compensar, a turbulência esteve geralmente baixa. O SQM marcou 20.40.
Desta vez trouxe o meu telescópio veterano de muitos relentos, o dobson de 20cm, que naquele momento se encontrava impróprio para consumo de imagens planetárias e estrelas duplas, tudo por culpa de um parafuso de colimação partido, mas ainda foi servindo para visitar objectos naturalmente difusos como o cometa Tuttle abaixo esboçado.
Este cometa, que nos visita cerca de 13 em 13 anos, está quase a chegar ao seu periélio (27 Janeiro), movendo-se no céu na altura da observação aparentemente -0.58 graus/dia em AR e -2.47 graus em declinação, encontrando-se a descer a pique na constelação da Baleia (Cetus), que na altura já se encontrava bastante atenuada pelo o globo de poluição luminosa do Montijo. Apesar de tudo, ainda se apresentou bastante perceptível, como uma nebulosidade arredondada, muito pouco condensado e sem cauda.
O extraordinário cometa 17P Holmes continua ainda a ser um objecto visível com a vista desarmada, encontrando-se no momento a pouco menos de dois graus da Algol (Beta Persei) na constelação de Perseu.
Cometa P/Tuttle 8P 2008-01-12 22:00 UTC
Concentrei-me de seguida num enxame favorito da corrente temporada, o NGC 2264. Este enxame é interessante por diversos motivos. Num telescópio que inverte a imagem, como um refletor newtoniano, assemelha-se bastante à forma triangular de uma árvore de Natal, mas com a "estrela" na base e não no topo, dominando o enxame, ou mais precisamente uma associação (OB) que ocupa cerca de meio grau do campo, que no campo visual da Panoptic 24mm ficou bem enquadrado.
Esta jovem associação dista cerca 2400 anos-luz de nós. As associações, ao contrário dos enxames, são grupos de estrelas que não estão gravitacionalmente associadas, e quanto mais afastadas, mais antigas serão. Esta, é muito compacta e tem associada uma grande região repleta de nebulosas e poeiras, responsáveis pelas espectacularmente coloridas imagens de longa exposição, tais como a Nebulosa do "Cone" e a "Pele de Raposa" - infelizmente visualmente nem deram para desconfiar.
A estrela atrás mencionada, S Monocerotis é no entanto muito especial, sendo uma estrela tipo O7.5III-Vf (e antes que mudem de "canal", O7.5 - temperatura entre 25000° - 45000° Kelvin, III-V luminosidade gigante-anã e "f" porque emite nas linhas de hélio e nitrogénio), quase se situa quase no topo da escala de temperaturas de estrelas. Mesmo à distância de 1020 ± 230 anos-luz, brilha aos nossos olhos à volta da magnitude 5. Estrelas com esta espampanante luminosidade são muito efémeras, e por tal relativamente raras de se encontrarem, muito menos visualmente como foi o caso.
A pouco menos de dois graus, a nebulosa variável de Hubble, NGC 2261, é por sua vez iluminada pela R Monocerotis, que não se consegue observar em luz visível (nem com o telescópio Hubble), encontrando-se muito próxima de uma estrela de magnitude 10 (TYC 746 1024) que serviu de modesto farol de sinalização. A nebulosa foi apenas visível usando a visão indirecta, não dando também oportunidade para visualizar convenientemente a sua característica forma de cometa, não me tendo restado alternativa senão a de borrar disformemente o papel com a ponta do dedo. Na falta de melhor, aqui está uma imagem que lhe fiz há 3 anos aqui no pátio.
A variabilidade desta nebulosa já é conhecida desde 1861, mas ficou célebre por ser uma das primeiras imagens feitas por Edwin Hubble com o Telescópio Hale de 200" acabado de inaugurar no Monte Palomar em 1947. Ele notou ao comparar duas imagens separadas em alguns anos, que a nebulosa apresentava um brilho diferente. Desde dessa altura têm-se observado variações até 4 magnitudes no brilho, que não depende apenas da variação da estrela, mas também da movimentação de poeiras.
A estrela responsável que está enterrada em 200 UA de poeira, e parece ter todos os sinais de que está no seu estado inicial de formação: muita poeira, muito gás e muita acção, com acreção e perda de massa simultaneamente. A R Monocerotis será uma estrela do tipo A ou B com o dobro da massa do nosso Sol, e com a sua parceira T Tauri de 1.5 massas solares, irá formar, para não variar, mais uma bela dupla de estrelas.
NGC 2261 & NGC 2264
Também dignos de registo, ficam um curioso agrupamento dos satélites mais brilhantes do planeta Saturno excluindo Titan, planeta que por sua vez apresentava os seus anéis bem menos inclinados do que foi habitual nos últimos anos. A galáxia do "charuto" Messier 82 (se calhar é altura de escolher uma alcunha politicamente mais saudável), apresentou bastante detalhe dos numerosos veios de poeira que a rasgam. Tudo isto no Obsession 15" do Alberto, onde ainda se fez uma tentativa para se observar a elusiva Sirius B, ficando no entanto, a memória telescópica da estrela mais brilhante do céu também bem marcada na retina.
Uma bela e concorrida noite para abrir a nova temporada na Atalaia e como sempre existe sempre mais para ler e ver as imagens em www.atalaia.org .
Bibliografia:
Kaler, Stars and their spectra, 1ed, Cambridge University Press, 1997
Kaler, The Hundred Greatest Stars, Copernicus Books, 2002
O'Meara, The Caldwell Objects, Sky Publishing Corporation, 2002
Pátio 264 - Eclipse Lunar Total
2008.02.21
Pátio (Leiria 39.75N 8.82W alt. 60m)
Existem alturas em que compensa ser paciente. Durante todo o eclipse, a Lua esteve sempre completamente ocultada por nuvens que iam ficando cada vez mais escuras, tendo até chovido durante um quarto de hora. Uma aberta, que apesar de ainda muito nublada, ofereceu os efémeros 10 segundos que permitiram guardar a recordação abaixo, e que infelizmente terá que durar por alguns anos. Como é natural, não chegou para determinar a escala de luminosidade do eclipse, que segundo alguns relatos, foi muito brilhante (entre 3 e 4), à semelhança do eclipse anterior.
O próximo eclipse lunar total terá lugar em 21 de Dezembro de 2010, mas com a Lua na totalidade a apenas um dedo acima do horizonte. Na prática só em 28 de Setembro de 2015 é que será possível observar em Portugal Continental um eclipse lunar total do princípio ao fim.
No calendário Gregoriano, a Páscoa ocorre no Domingo a seguir à Lua Cheia eclesiástica em Março 21 ou dia(s) seguinte(s), ao contrário da crença popular de que é no Domingo a seguir à primeira Lua Cheia após o Equinócio da Primavera.
Este ano, ambas as Lua cheias caíram bem em cima do dia 21 de Março (e por mero acaso depois do equinócio que ocorreu no dia 20), resultando numa das Páscoas mais recuadas desde 1913, ano em houve outra a 23 de Março, sendo a próxima neste dia apenas em 2160.
As duas Luas Cheias, a astronómica e a eclesiástica, não ocorrem necessariamente simultaneamente, pois a segunda não tem em conta a grande complexidade de factores que regem o movimento da Lua à volta da Terra. Outra regra eclesiástica que não é propriamente científica, é a que o equinócio também não é sempre a 21 de Março, podendo ser no dia 20. O equinócio nem sequer tem qualquer relevância, sendo apenas uma coincidência. Mas para se perceber melhor como tudo funciona é necessário entender como é que os calendários funcionam.
O Calendário Gregoriano é nada mais que o calendário utilizado por todos os países como calendário civil padrão. Apesar da sua origem tenha sido para regular as cerimónias religiosas da Igreja Católica Romana e Protestante, ficou de facto o calendário comum a todas as civilizações e povos, sendo usado a par de outros calendários que passaram a ter uma importância mais religiosa e cerimonial. A origem deste calendário não foi uma tarefa fácil, e a sua adopção generalizada quase que chegou ao século XIX.
O Calendário Juliano
Antes da introdução deste, o calendário usado era o chamado Juliano, que foi introduzido em no ano -45 (-46 a.c) por ordem de Júlio César, sendo este baseado no calendário solar, dividindo o ano em 12 meses de duração fixa. Os anos "normais" tinham 365 dias e os bissextos 366 dias que ocorriam de 4 em 4 anos. Reparar nos conceitos que ainda hoje são utilizados, como a adição de um dia de 4 em 4 anos, tornando o ano médio em 365.25 dias, ajustamento que aproxima muito ao ano tropical (ou solar, sendo este o tempo médio entre dois equinócios da Primavera (ou Vernais) com valor médio de aproximadamente 365.24).
Nota: Meeus em More Mathematical Astronomy Morsels escreve que a definição de Danjon é a correcta, ou seja, o ano tropical é o tempo que a longitude média do Sol é adicionada 360 graus - a razão e explicação é um capítulo inteiro desse livro, mas mais uma vez as perturbações gravitacionais têm culpas no cartório.
O Calendário Gregoriano
Passados mais de uma dúzia de séculos, aquela pequena diferença no ano médio tornou-se óbvia, com a data da Páscoa a afastar-se cada vez mais da relação que tinha com o dia 21 de Março e a Páscoa Hebraica. A razão está na precessão dos equinócios, desvio causado por efeitos gravitacionais causados pelo Sol e outros planetas sobre a Terra e ainda outros efeitos menores, mas mensuráveis, que por altura do século XVI se acumulavam já em 10 dias (1 dia por cada 128 anos), com as Luas novas a ocorrerem 4 dias antes da luas eclesiásticas.
O problema foi resolvido com a bula papal "Inter Gravíssimas Curas" (Trad:"Entre os nossos sérios ofícios..."), assinada pelo o Papa Gregorio XIII em 24 de Fevereiro de 1582. Numa penada, tirou 10 dias ao calendário em uso (o Juliano) acertando assim o dia 21 de Março com o equinócio da Primavera (apenas aqui teve qualquer significado), e mandou fazer novas tabelas de Luas Novas e Cheias. A razão da Páscoa Ortodoxa ser em data diferente é por ainda continuar a usar o calendário Juliano e as regras "antigas".
Comparando com o calendário Juliano, as regras de cálculo ficaram um pouco mais elaboradas:
Cada ano que é divisível por 4 é um ano bissexto, exceptuando os anos que são divisíveis por 100, mas destes últimos serão bissextos se forem divisíveis por 400.
Isto significa que o calendário gregoriano é constituído por ciclos de 400 anos, que são 146097 dias que por sua vez, é um número divisível por 7 (dias da semana). Se se dividir 146097 por 400 dá um ano médio de 365.2425 que se aproxima bem mais do ano tropical 365.2422 (em 2000). Tudo isto resulta num erro estimado de 1 dia em cada 2500 anos.
Lua Astronómica 23:01 UTC
As tabelas das Luas Cheias e Novas foram calculadas com base no ciclo metónico (de Meton, astrónomo grego, 420 AC) que foi o primeiro a reparar neste ciclo natural). O ciclo metónico consiste em 235 lunações, num período de 19 anos gregorianos. Uma lunação é o período entre duas Luas Cheias (por exemplo) e actualmente duram em média 29 dias, 12 horas, 44 minutos e 2.88 segundos. Esta periodicidade de 19 anos, na prática resulta em que a determinada fase da Lua se repete mais menos no mesmo dia de calendário de 19 em 19 anos. No caso mais pertinente, uma boa maneira de calcular a Lua Cheia a partir de um determinado e arbitrário dia.
Este ciclo de 19 anos, também chamado ciclo dos Números Dourados, permite à escala da duração da vida humana calcular facilmente as fases da Lua. Cada ciclo adiciona 0,08 dias de erro que nas tabelas é tido em conta, que saliente-se, não são elaboradas com base em efemérides astronómicas, mas por regras terrenas. Existem outros ciclos que apresentam menor erro, mas são de períodos bem maiores (372, 725, 1097 anos), mas a sua utilização no entanto não teria grandes efeitos práticos, excepto para grandes períodos. De qualquer modo, existem ainda muitos anos em que a Páscoa eclesiástica é diferente da Páscoa "astronómica", mas a que no final conta é obviamente a eclesiástica, que como podem ler neste link não é um assunto propriamente trivial de se calcular manualmente.
Bibliografia:
Mathematical Astronomy Morsels, Meeus
More Mathematical Astronomy Morsels, Meeus
Explanatory supplement to the Astronomical Almanac, Seidelmann 1992 University Science Books
Pátio 267 - Mercúrio
2008.04.05
Pátio (Leiria 39.75N 8.82W alt. 60m)
Mercúrio
Pátio 266 - Leituras recentes
2008.04.15
Pátio (Leiria 39.75N 8.82W alt. 60m)
Observer's Handbook 2008
Patrick Kelly (editor)
The Royal Astronomical Society of Canada
ISBN-978-0973810950
Livro quase de bolso com todas as principais efemérides para o ano que decorre. Este manual de observação é uma coleção de artigos sobre quase tudo o que é pertinente ao observador do céu, desde os fenómenos tão próximos de nós como os atmosféricos (halos e arco-íris), até a procura de supernovas, passando por artigos sobre instrumentos, acessórios e ópticas, todos os eclipses da temporada, ocultações lunares, meteoros, fenómenos das luas de Júpiter e Saturno, listas de objectos interessantes, e muitas, muitas dicas que nenhum astrónomo amador observador deixará de considerar interessantes.
É certo que quem assinar ou leia regularmente alguma revista de astronomia, tem sempre as secções do que se passará nesse mês, mas este manual tem a vantagem de ter o ano todo num formato bem compacto e especialmente bem organizado, sendo o parceiro perfeito para o incondicional do Karkoschka, e uma boa leitura para noites nubladas.
Observational Astronomy for Amateurs
John Benson Sidgwick
Enslow Pub Inc; 4th edition (June 1982)
ISBN-978-0894900679
Este livro foi escrito em 1957, altura em que não havia disponíveis computadores, calculadoras ou câmaras CDD, sendo essa a razão do meu grande interesse de saber como é que os astrónomos amadores de há 50 anos atrás contribuíam com as suas observações para a ciência. É muito interessante ler como se calcula as efemérides de um novo cometa, usando apenas um lápis e papel (claro que uma calculadora dá jeito), ou como fazer a redução de estimativas de estrelas variáveis. Este livro incide especialmente na observação do sistema solar: Sol, Lua, cometas e restantes planetas, e até como fazer croquis de auroras. Para objectos de céu profundo, não vai para além das estrelas variáveis e estrelas binárias, dando apenas meia página à observação de galáxias que de resto considera a sua observação como um bom método para aperfeiçoar as capacidades de observação, ponto de vista com o qual concordo plenamente.
As tabelas de efemérides há muito que passaram de validade, mas por 1 dólar americano + portes é uma boa adição à biblioteca, apesar de não ser tão enciclopédico como a sua magna opusAmateur Astronomer's Handbook 3rd Edition.
Castelo de Vide
2008.06.07
Castelo de Vide
Algures num sítio no meio dos montes, apenas acessível através de algum corta-mato estava à espera uma jantarada à caçador. Estivemos cerca de uma dúzia : Alberto, José Ribeiro, João Gregório, Filipe Alves, Rute, Acácio, Licínio, Henrique e dois companheiros de Tomar cujo o nome sempre me escapou!, e ainda os nossos anfitriões que nos preparam a jantarada.
Já tão perto do solstício de Verão, a noite foi muito curta a acabou às 4:06 da madrugada, só tendo realmente começado a ficar escuro após o ocaso da Lua pelas 00:30. O SQM marcou 21.40, valor que classifica o local como escuro, com o braço da Via Láctea e o grande "Rifte" de poeira bem proeminentes e detalhados, tendo atingido uma magnitude visual limite no zénite a rondar 6. Algumas nuvens altas e um baixo horizonte um pouco ratado pela poluição luminosa. A temperatura não baixou dos 12 graus e não houve humidade significativa.
No início da noite, fui acompanhando a lenta reaparição das estrelas, e a da sempre importante estrela Polar para alinhar as montagens. A Lua tinha como companhia o planeta Marte a apenas três dedos. Passou também a ISS toda fulgurante com o seu novo laboratório e um Space Shuttle atarraxado. Foi tentado ver algum detalhe com o Obsession de 15", mas sem sucesso.
Já lá vão algumas luas desde que passei uma noite inteira no campo, não sendo alheia a meteorologia algo caótica que associada a alguma pouca sorte, gorou sempre os planos para alguma observação.
Montei então o Takahashi Sky-90 em cima da Takahashi P2-Z , e com a Panoptic 24mm dei uma volta de alguns velhos conhecidos com apenas 21x de magnificação: Messier 13, Messier 92, Messier 57, Messier 9, Messier 56, Messier 51/NGC 5195, Messier 27, Messier 101, e ainda Júpiter com dois "brincos" (Io e Calisto).
Sendo esta, a primeira que consegui identificar a planetária NGC 6826 "Blinking" nesta magnificação, muito pequena é certo mas com efeito de pisca-pisca bem evidente.
No Obsession do Alberto vi o grandioso Messier 22 e a estrela WR140. Houve ainda muita actividade meteórica, e possivelmente algumas Arieteidas(?) cujo o máximo (ZHR 60) segundo o Observer's Handbook 2008 do RASC, seria a menos de dois dias.
Depois, fui ver se ainda me entendia com a astrofotografia, tirando algumas exposições de focagem em Vega.
Vega (Alpha Lyrae)
Esta estrela, à qual que não perco uma oportunidade de apreciar, é talvez depois do nosso Sol e da Polaris, a estrela mais reconhecida pelas pessoas em geral, não por ser a 5ª estrela mais brilhante do firmamento, mas sim como estrela (esta sim genuína) do filme "Contacto" baseado no livro homónimo de Carl Sagan.
Apesar da sua classe espectral (A0) ser de uma já quente estrela branca, a imagem revela um imenso mar de luz azulada, cor a que não fica alheia de ser a primeira classe (0) depois da classe B de estrelas azuis. O catálogo Hipparcos situa-a a 25.30 anos-luz (± 0.11), distância que permitiu determinar o seu diâmetro real (0.00308 - 0.00324") que representa um diâmetro 2,56x do Sol, que por sua vez revela uma das suas características invulgares como a sua forma esferóide "abatatada" causada pela sua rápida rotação de apenas 12.5 horas, que comparada com os quase 26 dias do nosso Sol a torna num alucinante pião.
Ainda à semelhança do nosso Sol, Vega encontra-se a meio da chamada "sequência principal", fase relativamente estável na vida das estrelas durante a qual vão pacificamente queimando o hidrogénio em hélio, que no caso de Vega, sendo uma estrela mais quente (9400 K), "apenas" durará à volta de mil milhões de anos, que é cerca de 10% da vida esperada para o nosso Sol.
Estrelas quentes mais massivas que o Sol não duram muito, mas para compensar têm um assombroso débito de luminosidade, que no caso de Vega chega quase a 50x a do Sol, facto que deve impedir o desenvolvimento em tempo útil de um sistema solar algo parecido com o nosso, conjuntamente com alguns organismos com um QI superior a de um vírus, por muito que os escritores de ficção científica o desejem, mas julgo cada vez mais que tudo é possível. A imagem tem 120 segundos de exposição.
*0,00324*7,756*206265 = 4927,357327" segundos de arco - tamanho aparente à distância do Sol (1 AU) = 82 minutos de arco, que é cerca de 2,56x o tamanho do Sol
A galáxia Messier 101 é um alvo muito concorrido nesta altura do ano, situada na cauda da Ursa Maior que por esta altura dá o pinote por cima da polar por volta da meia-noite, colocando-a bem alta no horizonte.
Visualmente no 90mm, não passava duma leve nebulosa com uma dimensão jeitosa, sem qualquer detalhe digno de nota. Coloquei então a câmara no telescópio e expus apenas durante uma hora (20 exposições de 3 minutos a ISO 1600), após a qual a bateria de gel ligou a luz de "empty" terminando assim a sessão astrofotográfica - esta bateria já está pronta para ser reciclada, mas cumpriu bem o seu dever durante mais de 4 anos.
Se o ruído térmico da Nikon D70 já é péssimo, bem pior ficou com uma noite tão agradável. Com tanta variação de temperatura entre cada exposição, o ideal (mas ingrato) seria obter um "dark frame" para cada exposição, mas possivelmente sairia um pouco melhor. A nível de processamento (ou falta dele), prefiro escolher ver o ruído a perder detalhe com o resultado de algoritmos manhosos que por vezes experimento. De qualquer modo, não aconselho a fazer à imagem equalize a pessoas impressionáveis.
O grupo da Messier 101 está a cerca de 21.2 milhões de anos-luz (Karachentsev, 1996), sendo o menos populado de galáxias da esfera de 8 Mpc (26.1 milhões anos-luz) em redor do centro do Grupo Local, o chamado Volume Local. A galáxia Messier 101 é a rainha indisputada desta região, conjuntamente com a NGC 5585 (não capturada na imagem), mas esta última num longínquo segundo lugar brilhando 3 magnitudes abaixo. Este grupo tem 11 membros confirmados e outros tantos suspeitos, praticamente todos eles demasiado ténues para observação visual.
Para melhor detalhe, ver aqui uma imagem capturada com a saudosa Atik-1HS. Esta é uma linda galáxia "Grand Design" praticamente de frente para nós, e por estar relativamente perto é possível observar várias regiões de hidrogénio que fazem parte da composição grande parte das nebulosas de emissão, tendo sido distribuídas meia dúzia de designações NGC por serem tão proeminentes - infelizmente a Nikon d70 é completamente cega nessa parte do espectro.
Se clicar na imagem mostra um campo de 3x2 graus, no qual se podem observar muitas galáxias, nomeadamente os NGC 5475, 5442, 5486, 5422, 5485, 5473, 5477, 5474 e ainda UGC 9071.
Messier 101, "Galáxia Remoinho"
Takahashi Sky-90 f/4.5 (407mm) + Nikon D70 3.95"
exp: 60 min (20x180s) ISO 1600
WR 140
A WR 140 é um sistema binário de estrelas gigantes WC7 (Wolf-Rayet) e uma estrela O5, onde por ocasião da sua maior proximidade, ocorrem violentas colisões dos ventos solares que podem atingir cerca de 3000 km/s. Neste sistema tipo CWB (“colliding-wind” binaries) foi registado a maior emissão de raios X e rádio não pertencentes a objectos compactos, e ainda emissão no infra-vermelho associada à formação de poeiras.
As estrelas Wolf-Rayet são raras e a sua natureza violenta causa o caos na sua redondeza produzindo regiões como a de nebulosa "Crescente", esta visível por cortesia da WR136 também localizada na constelação do Cisne.
O que torna este sistema binário num importante alvo de estudo, é que devido às suas orbitas extremamente excêntricas, os diferentes fenómenos associados às diversas posições das estrelas entre si podem ser observados periodicamente, nomeadamente a interacção dos ventos solares perto do periastro (distância mínima entre dois astros), que é cerca de 16x inferior no apoastro (distância máxima).
Este enorme diferencial torna-a numa espécie de acelerador de partículas natural em que se pode testar diversos parâmetros e modelos num intervalo de 7.9 anos, com a vantagem de ser muito brilhante e estar ao alcance de instrumentos de abertura modesta. Sobre este sistema está aqui tudo o que é necessário saber.
Este sistema vai ser alvo de uma campanha de observação durante período anterior, durante e posterior à passagem do seu periastro que será em 12 de Janeiro de 2009. Nesta campanha vão participar alguns astrónomos amadores portugueses, nos quais estou incluído, em que vai ser usado o MONS Cassegrain 50cm f/15 do Izana Observatory - Tenerife.
Este ano cheguei ao fim da tarde à Barragem da Póvoa e Meadas vindo directamente de Leiria, tendo infelizmente perdido as palestras em Castelo de Vide. Aproveitei o sossego do local que ocasionalmente era perturbado pelas cegonhas e outras aves, e também pelo tilintar de uma cana de pesca que tinha fisgado mais um peixe. Fiquei a pensar que a pesca talvez seja o hobby mais semelhante ao de astronomia: é passado ao ar livre, tem instrumentos para capturar, uma notória quase ausência do género feminino, e na grande maioria das vezes é praticado de noite - apenas muda aquilo que é fisgado, que embora não alimente o corpo, alimenta a alma.
Com o início da noite, aconteceram duas cenas interessantes nos lados opostos do céu. A Leste nasceu um fulgurante Júpiter (-2.7 de magnitude) cujo brilho riscava as águas da barragem de margem a margem. No lado oposto a Oeste, caia a Lua seguida por um trio formado pela a estrela Regulus (Alfa Leonis), e os planetas Marte e Saturno, todos eles com magnitudes semelhantes e quase equidistantes, apenas separados por pouco mais de 2 graus e meio. Um belo final de tarde, que só conspurcada por uma massa de nuvens passageira que demorou uma ou duas horas a passar.
O local de observação foi na habitual península que este ano esteve quase para tornar um ilha, estando a barragem bem atestada de água. Fora alguns carros, que por curiosidade passavam e apontavam por vezes as luzes dos máximos, não houve grandes interrupções.
À semelhança do que se passa no resto do País, este local já está a começar a ficar rodeada de globos de luz, uns pequenos e outros maiores, mas todos a ajudar a arruinar quase todo o baixo horizonte e em geral a escuridão do local. Mas por enquanto ainda é possível observar bem os braços da Via Láctea, e até o enxame globular Messier 13 com a vista desarmada, oferecendo uma magnitude visual no zénite superior a 6. O SQM marcou 21.40 (com a Via Láctea no zénite), valor que não me importava nada ter disponível a 50 quilómetros em redor do Pátio.
Utilizei durante algum tempo o binóculo Fujinon 16x70, que de momento é o meu instrumento de observação de eleição. Percorri várias cartas do Karkoschka. Na carta N12 fiz o pleno: todos os alvos são galáxias em Cães de Caça,NGC 4244, Messier 106, NGC 4449, NGC 4490, Messier 94, Messier 63 e Messier 51/ NGC 5195 com esta última a mostrar os núcleos bem distintos e imersos em nebulosidade.
Depois passei para a carta N10 que se centra na Ursa Maior, onde observei sem qualquer dificuldade a Messier 101, Messier 97, Messier 108 e a Messier 40 (que curiosamente a 16x parece um par de estrelas envoltos em nebulosidade) e finalmente o troféu, a detecção da galáxia Messier 109 perto da sigma. Esta última não é nada fácil, só com a visão indirecta é que consegui ter breves vislumbres.
Com 4 graus de campo e uma magnificação de 16x, torna-se impossível ficar indiferente à espectacular região de Escorpião, Sagitário e Escudo. É uma paisagem da nossa Galáxia que deveria ser considerada património universal e deveria ser protegida por lei. A visão binocular de grande campo oferece o mais parecido que existe com o "ir até lá" : um autêntico passeio 3D.
Muitos outros foram observados durante toda a noite onde destaco a Helix, os globulares na base do pote em Sagitário, Messier 33 em Triângulo, Messier 31/32/110 em Andrómeda.
Espero ter aliciado mais alguns adeptos para binóculos de média/grande abertura, que são extraordinários instrumentos sob um céu escuro. Um pouco pesados se não estiverem apoiados, mas o esforço será bem recompensado.
Estiveram poucos, mas bons: um Celestron C11, dois Obsession de 15" e 18", 1 Dobson de 6" f/8 construído pelo o dono (imagem muito boa) ,um ou dois dobson de 10" (julgo eu), um ETX (reconheci o seu ronronar) e eu apenas trouxe os meus binóculos de 7x50 e 16x70.
A nível da participação, esteve composto e chegaram a estar talvez dezenas de pessoas simultaneamente, especialmente durante a excursão escolar e como sempre houve muitas e interessantes cavaqueiras. Os Obsession de 18 e 15 polegadas foram os telescópios de serviço (de luxo diga-se) nesta festa, nos quais nas horas de ponta houve momentos de alguma espera.
Nestes, entre outros, observei o quinteto de Stephan em Pégaso (ou coisa parecida na zona) e o NGC 7789 no primeiro, e belas vistas de Messier 17 (Cisne) e Messier 16 (Águia) e da Messier 76 "Little Dumbell" no último. No Celestron C11 vi Júpiter no momento exacto que a grande mancha vermelha estava a transitar, e também os restantes gigantes gasosos Urano e Neptuno.
A noite acabou com o crepúsculo astronómico e mais uma passagem da ISS, pondo-me de seguida mo caminho de volta a Leiria.
Para todas as imagens deste relato usei a pequena montagem Takahashi Teegul na sua configuração base (que cabe na palma da mão) em cima de um tripé de fotografia. Para conseguir estrelas (e planetas) pontuais mesmo usando uma objectiva de tão pequena focal (50mm), foi absolutamente necessário um motor sideral cujo a acção está bem presente nas imagens onde se vê a paisagem terrestre "arrastada" com apenas 30 segundos de exposição. A imagem de Júpiter e do alinhamento são de 30 segundos e a de Escorpião/Ofiúco são apenas 6 imagens de 2 minutos.
Júpiter
Alinhamento Saturno-Marte-Regulus e Lua crescente
Escorpião e Ofiúco
Aeródromo XXVI - Eclipse Lunar Parcial
2008.08.16
Aeródromo da Gândara do Olivais (39.77N 8.82W alt. 52m)
Mais um eclipse lunar, mas desta vez parcial. Depois de uma quinzena de Agosto com grande parte dos dias ensolarados, tinha logo que calhar ser hoje um dia de chuva e nuvens que não pareciam ter fim. O Meteosat deu esperanças que talvez surgisse um boa aberta, o que felizmente acabou por suceder durante quase todo o eclipse, apesar de ainda haver nuvens altas que estragaram um pouco a nitidez.
A Lua foi eclipsada pela a umbra em cerca de 81%, que apesar de não ser tão espectacular como num eclipse total, foi ainda o suficiente para notar visualmente as cores alaranjadas na parte da Lua que estava sombreada pela a Terra. A câmara fotográfica, bem menos sofisticada que os nossos olhos, obrigava a sobre-expor o "crescente" penumbral para se poder captar as tonalidades da parte umbral.
Apesar da escala Danjon de luminosidade do eclipse não se possa propriamente aplicar a eclipses parciais, a intensa cor acobreada observada faz-me crer que este eclipse talvez poderia ter sido significativamente escuro.
O planeta Neptuno esteve bastante próximo da Lua, mais precisamente a 49' pelas 18:53 UT, que apesar de muito pouco brilhante a 7.8 de magnitude, ficaram os seus 2.35" de tamanho aparente representados por um modesto par de pixels, o que não é nada mau para um planeta que fica 4300 milhões km de Leiria... Abaixo ficam alguns momentos com um toque dramático adicionado por algumas nuvens (in)oportunas.
Pátio 268 - Conjunção Mercúrio-Vénus e novo brinquedo
2008.08.23
Pátio (Leiria 39.75N 8.82W alt. 60m)
Ao final do dia, mais uma conjunção dos dois planetas interiores do nosso sistema solar, que nesta sessão já se encontravam bem mais afastados que na altura de maior aproximação pelas 5 da manhã, altura em que ficavam distanciados apenas 1 grau e 15 minutos de arco. Vénus com os seus -3.9 de magnitude, apareceu primeiro e ainda num céu bem azul, alguns minutos depois, Mercúrio ficava visível no binóculo 16x70.
Conjunção Mercúrio e Vénus 19:47 UTC
Adquiri recentemente a máquina fotográfica digital Canon 40D (curiosamente a tempo do eclipse lunar), que já se encontrava a um preço mais acessível do que na altura da sua introdução (cerca de menos 300 euros, o que deve significar que a 50D deve estar a sair). Esta poupança chegou para adquirir um TC-80N3, um disparador que permite programar sequências e exposições, uma objectiva Canon 50mm f/1.8, um cartão de 4Gb (15 Mbit/s) e ainda uma bateria.
Na utilização mais convencional, apenas considerei importantes as seguintes características: um tamanho bem mais ergonómico para as mãos de um adulto, permite ver a totalidade do campo da ocular usando óculos, e é construída em corpo de magnésio.
Para a astrofotografia considero ter as seguintes vantagens: usa baterias de grande capacidade (1500 mA) e aceita o disparador programável atrás mencionada directamente. Mas o que realmente interessa no final é o ruído térmico, que é espantosamente baixo e com quase ausência de amplifier glow, com tão poucos hot-pixel que é possível baptizá-los. Tendo em conta que o pixel é bastante pequeno, com 5,7 mícron, e que ao contrário das Nikon, deixa intocadas as imagens RAW!!!.
O temporizador programável TC-80N3, não é uma luxuosa comodidade, pois torna as sessões de astrofotografia simplesmente um acto de prazer. Numa penada, programamos o número de exposições que queremos (até 99 ou até o cartão de memória esgotar), com a exposição que queremos (até horas!), e basta deixar o equipamento abandonado à sua sorte, e mais particularmente, a mim ficar livre para outras observações.
O Liveview que apenas deve ter aplicação "normal" em imagem macro ou remota, permite magnificações de 5x e 10x em qualquer área do sensor, sendo uma grande mais-valia na focagem manual de telescópios: simplesmente funciona, mesmo a f/4.5. Com o Takahashi Sky-90, é possível ver em tempo real estrelas até 5 ou 6 de magnitude, mas para focar é preferível uma estrela um pouco mais brilhante. O zoom aumenta o suficiente para fazer um star-test para verificar a colimação.
Um efeito colateral de usar o Liveview é que faz levantar o espelho, dando a tão estimada função de mirror-lockup que minimiza alguma eventual vibração provocado pelo o espelho a subir e a descer, o que é especialmente eficaz na imagem solar e lunar.
As aplicações que acompanham a câmara são muito boas e rápidas, havendo versões para Windows e MacOS X, em que saliento a EOS utility que permite controlar a câmara através do cabo USB, incluindo o Liveview com 1 nível de zoom. Mas. a melhor novidade é permitir exposições com mais de 30 segundos sem cabos ou engenhocas adicionais (ninguém me tira a ideia que a Canon está a piscar o olho aos astrofotógrafos). A velocidade de descarga é quase instantânea numa porta USB2 (Hi-speed).
As imagens de teste abaixo foram feitas aqui no Pátio com um céu de magnitude 3 nos melhores sítios e uma Lua gibosa, condições no mínimo lastimáveis, mas não resisti à curiosidade de ver como a Canon se portava, e simultaneamente aprender a trabalhar bem com ela para quando estiver sob céu escuro. Descobri que o sensor está bem nivelado (importante), que a objectiva Canon 50mm é um pouco inferior â correspondente Nikkor na correção de campo.
O Takahashi Sky-90 com o seu redutor/aplanador (407mm), proporciona nesta câmara um campo de 3x2 graus, com uma amostragem de 2.89 segundos de arco, sendo uma boa configuração para imagem de grande campo com uma resolução interessante.
O cometa Boattini (C/2008 J1) encontrava-se a pouco menos de 2 graus do pólo, distância esta em que se torna notória a rotação de campo causada pelo menos-que-perfeito alinhamento polar. Nunca registei um cometa tão ténue, com apenas 13.8 de magnitude , muito menos com exposições tão saturadas pela a poluição luminosa, mas queria saber se seria possível - e foi.
O outro cometa Boattini (W1) nascia mais tarde e deveria ser mais acessível, mas encontrava-se muito próximo da Lua que ainda estava no seu Quarto, tornando-o invisível no binóculo e muito ténue nas imagens que lhe fiz, ficando assim estragada a "imagem" de família. Fazendo um triângulo com a Delta (δ) UMi (Yildun) A1Vn de magnitude 4.35 e a 24 UMi, está uma pequena galáxia PGC 0060075 (UGC 10923A) de magnitude 14.3 entre outras ainda mais pequenas e ténues.
Cometa C/2008 J1 (Boattini) 23:49 UTC
Takahashi Sky-90 f/4.5 (407mm) + Canon 40D 2.89"
exp: 21 min (14x90s) ISO 1600
Enxame duplo NGC 869 & NGC 884
Takahashi Sky-90 f/4.5 (407mm) + Canon 40D 2.89"
exp: 30 min (30x60s) ISO 1600
Enxame globular Messier 15
Takahashi Sky-90 f/4.5 (407mm) + Canon 40D 2.89"
exp: 15 min (15x60s) ISO 1600
StarParty Galáctica
fotões 2008.08.30
Observatório Astronómico de Vila Nova
Encontro organizado pela a Galáctica , mais precisamente pelo Carlos Reis e João Clérigo, no recentemente construído observatório de Astronomia e Natureza no parque eólico de Vila Nova.
As instalações são impecáveis, com um auditório, bar, WC e alojamentos para quem queira passar lá a noite, situando-se a 30 metros do marco geodésico que marca 940 metros de altitude. O acesso é alcatroado, mas para quem venha a partir de Vila Nova e não por onde andei em estradões por meio de montes plantados de eólicas.
A tarde foi preenchida com apresentações do Filipe Dias, que falou sobre montagens e também da sua interessante experiência de registar a umbra durante um eclipse lunar com apenas uma exposição em filme, e do Carlos Reis deu uma introdução à astrofotografia, todas estas que seriam interessantes para muitas das pessoas que não apareceram, a que não deve estar alheio as previsões meteorológicas, que de resto foram péssimas até à 1 da manhã, altura em que como previsto pelo Calar Alto, finalmente se abriu. No final do dia houve um jantar que deu para recuperar o ânimo.
Mal as nuvens começaram a abandonar o local (nós estávamos mergulhados nelas), iniciou-se logo a montagem dos equipamentos. As nuvens desapareceram, mas não o vento, que de resto era de prever pois estávamos no meio de um parque eólico. O céu era escuro, com o SQM a marcar 21.0 mesmo contando com os fotões da "flashada" branca da eólica mais próxima, que infelizmente tornam o local impróprio para astrofotografia, com provável excepção de dois palmos no horizonte Sul, a turbulência associado ao vento também era forte. Mas no entanto, não impediu que a noite corresse bem, em que todos andaram entretidos a observar todo tipo de objectos e a registá-los.
Esteve lá equipamento de tirar o chapéu : duas G11, uma com um Celestron C11 e outra com um par de refratores que julgo serem Vixen, uma Vixen SDX com um C9.25, uma equatorial com um reflector Vixen R200SS, e vi pela primeira vez uma Takahashi NJP com um FS-102 - que grande besta de montagem, só aquele veio de contrapesos roscado mete medo. Confesso que andei durante anos enamorado por esta montagem, de cuja (nobre) linhagem faz parte a Takahashi P2-Z, que é por sua vez comparativamente microscópica. Ficam as vistas da galáxia do Escultor (NGC 253) no R200SS e nos Celestron.
Como sempre, trouxe o Takahashi Sky-90 e a (agora minúscula) Takahashi P2-Z, com os quais fiz umas imagens com a nova Canon 40D. O vento chegou a ter rajadas que faziam saltar as imagens e até parece ter desalinhado a montagem, fazendo-me perder algumas imagens. Por volta das 5 da manhã começaram lentamente a surgir nuvens altas, algumas delas sub-reptilinias que tive o infelicidade de encontrar em várias imagens. Arrumou-se o equipamento, alguns ficaram mais um pouco, e outros partiram para casa.
Usei o IRIS do Buil que é bastante rápido a processar imagens RAW RGB e 10M pixel de 14 bits, que quando descompactadas ocupam quase 60 MB cada fotograma. Parece pouco, mas quando se tem 20 imagens, e ainda darks, offsets e flats, podem ser necessários gigabytes de disco para passos intermédios e resultados do processamento. O interface com a origem comando linha e batch desta aplicação pode ser estranha para utilizadores actuais, mas filosofia de implementação resulta numa exigência de memória bastante inferior à da grande maioria dos programas, podendo até ser utilizado em qualquer pileca computacional, mas obviamente beneficia com um microprocessador rápido, visto que grande parte do processamento é de pura operação matemática.
As Plêiades já se encontravam relativamente altas para o meio da madrugada, mas infelizmente ainda se estavam num quadrante bastante afectado pela luz de sinalização das eólicas, resultando em imagens com um gradiente muito estranho, não havendo flat que tire aquela coisa. Apesar de tudo, aproveitei a meia dúzia de imagens que fiz da Messier 45, incluindo as arrastadas, para cozinhar a imagem abaixo. Esta imagem, apesar de ruidosa e com estrelas alongadas mostra a magnífica transparência do local com a nebulosa de reflexão Mérope bastante extensa.
A nebulosa planetária Messier 27 é o resultado de 20 imagens de 120 segundos e mostra bem que está no braço da Via Láctea, apanhou razoavelmente quase a totalidade da nebulosa que o filtro IR deixou passar. Mesmo a 3" de resolução era demasiado para a turbulência. Com tanto vento era de esperar que as estrelas ficassem "gordas", o liveview da Canon 40D no modo de zoom 10x mostrava estrelas literalmente aos saltos, e tendo em conta que a resolução de amostragem é de 3", demonstra bem a turbulência do céu.
Enxame Messier 45 - Plêiades
Takahashi Sky-90 f/4.5 (407mm) + Canon 40D 2.89"
exp: 24 min (6x240s) ISO 800
Nebulosa planetária Messier 27
Takahashi Sky-90 f/4.5 (407mm) + Canon 40D 2.89"
exp: 40 min (20x120s eg.) ISO 800
Atalaia XXXI
2008.09.06
Atalaia (Montijo 38°44N 8°48W)
Na Atalaia, o céu apresentava umas sólidas 5 magnitudes na região da Ursa Menor e um pouco mais no zénite e nascente, com o braço principal da Via Láctea bem visível. A temperatura esteve agradável, com a humidade a chegar a meio da madrugada.
Neste sábado houve uma boa afluência, apesar de no dia anterior ter havido muito más condições meteorológicas que devem ter espantado a maioria. Pena foi as nuvens terem começado a chegar depois das três da manhã, obrigando todos a arrumar, mas ironicamente saímos do local com o céu praticamente limpo.
De vez em quando, o céu parece parar para lhe podermos fazer uma imagem. Neste caso, foram 31 com duração total de hora e meia, usando a Canon 40D, que não poderia ser chamada de câmara astrofotográfica, sem primeiro ser baptizada com os fotões da galáxia Messier 31. Dá gosto de ver todas estas associações, enxames globulares e abertos em apenas uma imagem, todos eles perdidos nos braços e no halo desta gigantesca galáxia. É certo que os globulares com esta resolução, têm todos aparência estelar, mas com a ajuda do excelente mapa que vem no livro Observing Handbook and Catalogue of deep-sky objects de Luginbuhl/Skiff, ainda consegui identificar uma dúzia deles até me ter fartado. A maior associação estelar é a A78, a que foi também atribuído o NGC 206 de tão evidente, assim como os grandes carreiros de poeira que definem os braços em quase toda a sua extensão.
Esta imagem resulta de 31 exposições de 3 minutos a ISO 800 usando uma montagem não guiada, às quais que foram subtraídas uma mediana de 10 darks feitos no local para que reproduzissem melhor o ruído da temperatura de aquisição das imagens. Estou a chegar à conclusão que tenho que começar a fazer conjunto de darks logo imediatamente à sequência de imagens, se quero ter pretensões de eliminar o ruído o melhor possível. Não existe outra maneira a dar a volta ao facto que a temperatura do sensor ter grandes variações entre a primeira e a última imagem. O ruído nas DSRLs é absolutamente caótico e tendencialmente galopante, mesmo com esta câmara que gera um ruído excepcionalmente baixo.
Outro factor importante, é ter um conjunto de imagens em que não exista demasiado dithering mecânico "não solicitado", vulgo erro de alinhamento e/ou tracção. A redução de ruído por empilhamento parte do princípio estatístico que o ruído (valor) de um mesmo pixel num conjunto imagens é diferente, permitindo assim suavizar o seu valor. Ora no caso de as imagens "passearem" muito, ou seja tenha um offset de deslocação muito grande entre a primeira e a última imagem da pilha, digamos 20 pixels, um pixel que seja mais quente não ficará suficiente suavizado, bem pelo o contrário, espalha o seu valor ao longo da deslocação da imagem, surgindo artefactos com a aparência de estrias. Como sempre, usei o IRIS para a calibração, empilhamento e uniformização da imagem. Fiz um flat sintético para disfarçar um bocado a vignetagem e o resto foi experimentar níveis e cores.
Com o disparador "maravilha" Canon TC-80N3, é possível programar, por exemplo uma sequência de 30 imagens e deixar o equipamento à sua sorte, apenas acautelando se há bateria suficiente para o tempo pretendido. Uma bateria (nova) carregada chegou para pelo menos 3 horas de exposição ininterrupta. É uma solução simples e eficaz, sem ter que andar com computadores atrelados, e ressalve-se, para quem possua uma montagem capaz para o tempo pretendido.
Visualmente, aproveitei-me descaradamente do Obsession 15" do meu vizinho Alberto, ficando escarrapachados mais uns fotões da estrela central da Messier 57, que apesar da turbulência deu o ar da sua graça, vi a "dupla-dupla" de Lira numa escala a que não estou habituado, com a separação de cada uma das duplas escandalosamente evidente. Estes e muitos outros durante toda a noite.
Esta imagem mostra os grandiosos 3 graus extensão da Galáxia Andrómeda, onde se pode observar os braços exteriores com estrelas azuis e brancas da População I rasgados por poeira e zonas de formação estelar, a contrastar com as pequenas e mais antigas estrelas vermelhas e amarelas da População II dos braços interiores e região nuclear. Sendo também curioso, o facto das pequenas galáxias elípticas satélites possuírem semelhante distribuição de populações de estrelas.
Atualização 2024
Reprocessei a imagem usando o DSS (DeepskyStacker), com empilhamento kappa-sigma 2,5, sem usar "flats" nem "darks" e posteriormente composta com Pixelmate Pro. Clicar na imagem para ver em resolução total (3000x2000 pixel).
Galáxia Andrómeda Messier 31 e satélites Messier 32/110
Takahashi Sky-90 f/4.5 (407mm) + Canon 40D 2.89" 145'x96'
exp: 93 min (31x180s) ISO 800
Fronteira I
2008.10.03
Fronteira, Portalegre
Fui passar esta noite ao Observatório Astronómico de Fronteira, onde se encontrava o José Ribeiro a capturar espectros de estrelas para os diversos projectos internacionais em que está envolvido.
Este observatório está excelentemente equipado e numa instalação moderna, que diga-se, de um autêntico luxo, pelo menos na perspectiva de quem anda com o material "às costas". Estando situado num ponto relativamente alto na margem da Ribeira Grande, está rodeado por muitos ninhos de cegonhas, proporcionando belos horizontes tanto diurnos como nocturnos. E claro, a proximidade de um bom restaurante é também um grande mais valia. Ao fim da tarde, vimos uma migração do que parecia ser gansos que vinham em vagas em direcção a Oeste.
Eu trouxe o meu equipamento habitual, que montei no pátio Este, que tem uma bela vista do horizonte que está relativamente pouco incomodado pela a iluminação pública. O céu esteve sempre limpo, com muito pouca humidade, mas um pouco de frio para a roupa que usava, que segundo a estação meteorológica do observatório chegou aos 7.7 graus.
Com tanta conversa, esqueci-me de medir o céu com o SQM, mas os braços da Via Láctea estiveram bem visíveis, com uma magnitude limite a rondar por cima os 6, mas foi-me quase impossível obter uma boa adaptação à escuridão, tanto por alguma iluminação pública, como por estar sempre a entrar e a sair do observatório.
A noite começou por volta das 11 horas, a experimentar uma câmara refrigerada (SBIG ST-10XME). Esta câmara é ideal para o Takahashi Sky-90 , com um campo de 125'x84' todo corrigido e a trabalhar a f/4.5 com uma resolução de 3.45". Esta câmara tem muito pouco ruído, e conjuntamente com o MaximDL torna-se numa solução extremamente fácil de operar, especialmente depois da ajuda do Zé. O CCD NABG em muitos campos é uma verdadeira floresta de bloomingAbaixo está uma exposição não filtrada de 4 minutos directa do CCD a -20°, sem calibragem e com apenas um log aplicado.
Voltei a colocar a Canon 40D para que o Takahashi Sky-90 não ficasse mal habituado.
O primeiro alvo da noite foi o IC 348, que é um jovem e compacto enxame com mais de 400 membros e com apenas 2 milhões de anos de idade,a pouco mais de 1000 anos-luz, características que o tornam um bom alvo para estudo da formação de estrelas, cuja presença de nebulosidade de reflexão faz normalmente indiciar, um pouco à semelhança do que se sucede na bem mais conhecida e espectacular região da Messier 42.
Outro aspecto notório, ou melhor, precisamente pela sua falta de notoriedade, trata-se a presença de regiões de absorção por poeiras, nem mais, as famosas "nebulosas escuras" de Barnard na parte superior da imagem Barnard 5 e as na parte inferior Barnard 3 e 4, cuja nebulosidade do IC 348 faz de alguma forma salientar. Todos estes e outros na vizinhança pertencem à grande nuvem molecular de formação de estrelas de Perseu (Região I). A estrela junto ao enxame é a Atik (Omicron Persei),uma gigante de espectro B1, situada bastante mais atrás.
Espero fazer uma imagem de grande campo desta região onde se encontram os 5 primeiros Barnards.
O segundo alvo foi a rainha das nebulosas, que não perdi a oportunidade de capturar com a nova câmara. Nesta imagem da Messier 42 usei o método Entropy Weighted Average (High Dynamic Range) do DeepSkyStacker que deu um aspecto curioso à Messier 42, mostrando bem que a Canon 40D não modificada é praticamente cegueta no h-alpha, que embora presente, tem um relação sinal ruído muito baixa e muito para além das minhas capacidades de pós-processamento. Mas para compensar, no azul, é comparativamente, bastante mais sensível, dominando a aparência geral da nebulosa. Esta imagem levou com 3 logs e fortes doses de "amaciador", com muita nebulosidade (e ruído) a não faltar.
Finalmente acabei a noite no remanescente de supernova Messier 1 que foi processada com um "drizzle" de 2x, na tentativa de optimizar a pequena abertura (90mm) e amostragem.
Fomos descansar um pouco já com o Sol a nascer.
A imagem de IC 348 resulta de 36x3 minutos de exposição, a Messier 42 61x1 minutos e a Messier 1 31x2 minutos, todas não guiadas, tendo sido (semi) calibradas e somadas no DeepSkyStacker sendo posteriormente processadas (logs) no IRIS e redução de ruído no PixInsight.
Takahashi Sky-90 f/4.5 (407mm) + Canon 40D 2.89"
exp: 108 min (36x180s) ISO 800
Complexo de Messier 42/43
Takahashi Sky-90 f/4.5 (407mm) + Canon 40D 2.89"
exp: 51 min (51x60s) ISO 800
Messier 1 - Nebulosa do Caranguejo
Takahashi Sky-90 f/4.5 (407mm) + Canon 40D 2.89"
exp: 62 min (31x120s) ISO 800
Pátio 269 - Takahashi EM-200 Temma2
2008.11.07
Pátio (Leiria 39.75N 8.82W alt. 60m)
É com grande alegria que vejo chegar aqui ao Pátio um novo brinquedo.
Confiando no que seria de esperar de um produto Takahashi, não me restaram grandes dúvidas em comprar aquela que para mim seria a melhor solução transportável de uma estação de trabalho e lazer, que permitirá envolver-me tanto em actividades lúdicas como também para observações mais cientificas./p
Estas duas noites aqui no Pátio foram dedicadas à adaptação ao novo equipamento, em que detectei as dificuldades e melhorei os procedimentos de montagem.
O modelo da EM-200 é o Temma2 (GO-TO) com velocidade máxima de 350x a 12V, ou 700x a 24V, montada em cima do recentemente introduzido tripé metálico de altura ajustável para montagens das series EM-2/11/200. Esta montagem é um grande salto na capacidade de carga em relação à Takahashi P2-Z, passando para o triplo (18 kg), adicionando ainda a capacidade GO-TO e de auto-guiamento.
O tempo de montagem não chega a 10 minutos, isto incluíndo um alinhamento polar decente: abrir o tripé e esticar as pernas, aparafusar a montagem ao tripé, colocar os contrapesos e finalmente colocar telescópio. O buscador polar não é mais que um simples e eficaz calculador circular mecânico, em que apenas é necessário ter horas certas e saber a longitude do local.
Takahashi EM-200 Temma2
Para se usar a funcionalidade GO-TO é necessária uma qualquer variedade de computador que possa enviar comandos para uma porta RS-232. O comando que é fornecido, apenas serve para ajustar os motores manualmente. A Takahashi fornecia há alguns anos um controlador (THC) que tinha as funcionalidades básicas de alinhamento e uma pequena base de dados, podendo ser este alimentado com a mesma fonte de energia da montagem, o que para mim chegava perfeitamente não fosse estar já descontinuado e o seu preço elevado (~600€), com a vantagem que não necessitaria de um computador.
Outra alternativa, é um palmtop (Windows Mobile ou PalmOS), mas excepto se estes serem da categoria industrial, tenho as minhas dúvidas de aguentarem o frio, humidade e de terem suficiente autonomia para sessões muito prolongadas, além de estar limitado apenas para controlo GO-TO.
Resta então o tradicional computador portátil, que na sua maioria tem uma autonomia muito baixa para o uso pretendido. De há 1 ano para cá surgiram os ultra-portáteis (netbooks) de relativo baixo custo, cujo desenvolvimento que tenho acompanhado até ter chegado à compra do Asus Eee PC 901.
Este pequeno portátil tem características a meu ver interessantes para quem anda no meio do "mato":
Autonomia - pelo menos 5 horas e mais importante: entrada directa de 12V, não havendo necessidade de conversores apesar de requerer que a bateria esteja bem carregada.
Portas USB - 3 portas USB2 - não chega para tudo mas pelo menos GO-TO, e duas câmaras estão garantidas. Para expansão de portas basta um pequeno hub usb auto-alimentado. O Bluetooth pode eventualmente ser usado para controlar a montagem.
LCD - botão dedicado para desligar LCD, com o nível de brilho mais baixo razoável. Existe maneira rápida de desligar Wifi/Bluetooth/webcam integrada para ainda maior poupança de energia.
O espaço em disco (SSD) neste modelo é 4+8 GB decimais, que depois de desinstalar muitos "inutilitários", ficou com os 2+8 gigas livres, espaço suficiente para instalar o Guide8 completo e o catálogo USNOA, o TTracer (pequeno programa para o Temma da Takahashi), o software da Canon (controlo Remoto e Professional Editor), a plataforma ASCOM e alguns "drivers". Sobrou um 1-1.5 gigas para imagens da sessão, mas facilmente se pode ligar um disco externo ou até um cartão de memória. A memória é de 1 giga sendo suficiente para o Windows XP Home pré-instalado e para software a ser utilizado. o Wifi já é B/G/N que proporciona uma boa velocidade para transferências mais rápidas com routers rápidos depois de uma noite de "trabalho".
O ecrã (8.9") e teclado são pequenos, mas minimamente utilizáveis. É todo em plástico ainda por cima branco, que convém não deixar cair, porque apesar dos discos SSD poderem sobreviver, o resto à volta tenho as minhas dúvidas. No seu conjunto, forma um sistema extremamente compacto a pesar pouco mais de 1 quilo e do tamanho de um caderno A5.
Abaixo fica uma exposição de 2 minutos não guiada da nebulosa Messier 1. O seguimento não correu muito mal...
Nunca fui dono de uma montagem que pudesse ser auto-guiada, e julguei que fosse um bicho de sete cabeças tendo em conta os, por vezes verdadeiros martírios, que passavam o pessoal que usa auto-guiamento. Mas antes de me por sob o céu, investiguei as diversas soluções que existem para corrigir uma montagem de modo a fazer imagens pontuais com duração de 10, 20, 30 ou mais minutos.
O auto-guiamento é um sistema que segue obsessivamente uma estrela, de preferência perto do alvo a capturar, fazendo pequenas correções para a montagem de modo a manter essa mesma estrela sempre na mesma posição, e por consequência todas as restantes estrelas (e objectos) da imagem.
Existem duas maneiras de monitorizar essa estrela, chamada de estrela guia:
Através de um telescópio guia, que não mais é que outro telescópio tipicamente mais pequeno, montado em cima ou lado do telescópio onde se vai capturar a imagem. Este sistema exige uma grande rigidez. Nada pode alterar a relação entre o telescópio-guia e o da imagem. Qualquer flexão ou folga nos anéis que seguram qualquer um dos telescópios, e respectivos manípulos de focagem e adaptadores, assim como os próprios tubos é o suficiente para causar um guiamento atribulado e assim obter imagens menos que perfeitas. Pode ser complicado equilibrar dois tubos diferentes, especialmente quando montados lado-a-lado, mas este método permite maior liberdade para escolher a estrela guia, movendo ligeiramente o telescópio-guia, podendo até guiar num núcleo de um cometa.
Usando o próprio telescópio de captura de imagem, em que parte da luz é desviada por um espelho ou prisma para outra saída. Este método necessita duma engenhoca chamada de Off-axis Guider, que se coloca no trem óptico antes dos filtros e câmara. Desta maneira é dispensada a complicação de ter um telescópio guia, que invariavelmente desequilibra a distribuição de peso, e não precisa de anéis de montagem absolutamente rígidos - todas as flexões e folgas afectam da mesma maneira tanto a estrela guia como a imagem visto partilharem exactamente a mesma fonte de luz. O Off-Axis Guider "rouba" alguns centímetros de focagem, podendo não ser possível focar, assim como rouba alguns fotões à imagem. No caso de alguns modelos de câmaras SBIG, pode existir um segundo CCD para função de guiamento, mas tem o inconveniente de se encontrar após os filtros de cor ou linha, tornando por vezes as estrelas guias demasiado ténues. Mais recentemente alguns modelos de câmaras CCD QSI já possuem uma saída off-axis antes dos filtros para guiamento.
Em ambos os casos, o dispositivo que observa a estrela pode ser o nosso olho, usando uma ocular com filamentos paralelos e perpendiculares iluminados por um LED, ou usando uma câmara (ex: webcam), que quando ligada a um computador, pode ser usada para correcções manuais observando a estrela e ir usando as teclas do comando da montagem.
Tanto olhando através de uma ocular guia, ou para um monitor, depressa se chega à conclusão que existem coisas na vida mais interessantes para se fazer, do que estar a olhar para uma estrela horas a fio, apesar de ter o seu apelo de demanda heróica. Mas é para isso que foram inventados os computadores, que com o software adequado "carrega nos botões" por nós.
A porta de autoguider que muitas montagens possuem, não passa geralmente de uma ficha que pode ter os mais variados formatos (DIN, RJ12 etc.) com 5 ou mais pinos em que 4 deles actuam nos motores com um simples sinal eléctrico, um pouco à semelhança do que acontece quando se pressiona os botões do comando. Não existe realmente um standard, mas as câmaras CCD astronómicas tem geralmente uma porta de saída de autoguider. Como se lerá mais abaixo esta porta não precisa de obrigatoriamente ser usada para se conseguir auto-guiamento.
PHD
Este programa é gratuito e funciona. Na sua configuração mais simples, basta uma webcam, uma montagem com driver ASCOM que suporte PulseGuide, e voilá, é só fazer imagens de 20 minutos de exposição. Este programa apenas necessita que se ponha uma estrela no CCD da câmara, e a partir desta auto-calibra-se, determinando automaticamente a orientação e a resolução da câmara/telescópio guia, e até determina o backlash dos motores e engrenagens, todos estes parâmetros essenciais para um bom guiamento. É absurdamente simples, para os parâmetros que resolve automaticamente.
Esta funcionalidade PulseGuide ou guiamento ASCOM é muito conveniente e prática, pois permite utilizando apenas um cabo de ligação, no caso da Temma, o cabo série RS-232, se possa controlar a montagem para executar Go-Tos utilizando qualquer software de planetário que suporte o ASCOM (no meu caso o Guide8) e também, mas de preferência não simultaneamente, enviar pequenos comandos de correcção à montagem quando se encontra a ser auto-guiada por um outro programa (PHD, MaximDL etc), partilhando graças ao ASCOM o mesmo cabo e respectiva porta.
Este tipo de guiamento é uma alternativa a usar a porta autoguider. Segundo o que se escreve na net, os resultados podem ser melhores ou piores, sendo muito dependentes da montagem. Só é pena a plataforma ASCOM apenas se encontrar disponível em Windows, e ainda por cima usando o .NET que torna virtualmente impossível a importação para outras plataformas como MacOs X. O driver ASCOM para Takahashi Temma que usei foi este que se pode encontrar em http://ccdastro.net/temma.html, que até ao momento, funciona sem problemas com todo o software onde o experimentei.
Equipamento ao Luar
Nesta primeira sessão usei a minha pobre Atik-1S como câmara guia, mas como não disponho de porta paralela no portátil para exposições longas, apenas me foi possível escolher estrelas guia muito brilhantes. Para tal escolhi as Plêiades que onde existem muitas estrelas brilhantes numa relativa pequena área. Fiz exposições de 5, 10, 15, 20 e 30 minutos, com todas elas com excepção da última saíram com estrelas pontuais, com gráfico de guiamento bem dentro do pixel (sub-pixel), se bem entendi o gráfico do PHD. A última exposição sofreu um (único) acidente a meio que não percebi ainda a razão, mas suponho que montagem já estivesse um pouco desequilibrada pois já tinha passado muito para além do meridiano, apesar de nada tenha sucedido nas duas horas anteriores.
Os telescópios ( Takahashi Sky-90 /FC-60) e câmaras (Canon 40D/Atik-1S) e restantes suportes pesavam um pouco mais de 7 kg, com a resolução da imagem de 2,89 segundos de arco, que não se pode considerar propriamente uma resolução muito exigente para auto-guiamento.
Esta configuração está seguramente aquém (espero eu) das possibilidades da montagem, tanto em resolução como em carga. O telescópio guia foi o Takahashi FC-60 de 60mm e 500mm de distância focal com uma amostragem de 2.3". Esta amostragem de guiamento é até menor que a da imagem, o que para as condições de turbulência da altura, até pode ter sido contraproducente, pois pode ter andando atentar corrigir a dita cuja.
O pequeno Asus Eee 901 portou-se muito bem, trabalhando mais de 3 horas, a fazer processamento de auto-guiamento, alimentando com 500 mA a Atik e 100 mA do conversor USB/Série, além de que grande parte do tempo andei a ver e processar as imagens com o software da Canon, que usei também para a captura de imagens. Sobrou mais de 1 hora e meia de bateria, tendo saído do pátio com a temperatura ambiente perto dos 5 graus.
Abaixo fica uma exposição de 15 minutos guiada das Plêiades.
Voltei novamente ao Pátio para mais uma sessão de treino. Desta vez, não havia Lua a competir com a poluição luminosa e com o fumo das lareiras locais, mas continua na mesma a ser inútil fazer exposições com mais de 2 minutos. Para fazer testes pouco importa...
Nesta sessão, levei a bateria do portátil ao "fundo", tendo estado a trabalhar continuamente 5 horas, alimentando a Atik-1S, que deve ter consumido uma boa parte dos 6600 mAh da bateria. Fiz várias exposições de longa duração (10,15,20,30 minutos), que correram bem, apesar das estrelas deformadas pelo frio e alguma descolimação, pelo que tenho de me lembrar de usar para a próxima o Kendrick no Takahashi Sky-90 para ver se não arrefece tanto.
Fiz também alguns conjuntos de 1 hora de exposições para testar a performance a longo prazo, mas sem a longa exposição a Atik-1S é praticamente inútil para guiamento, e se a estrela-guia tiver pouca relação sinal/ruído, o PHD estraga mais do que arranja, embora no entanto, avisar para tal facto. Um CCD para guiamento está na lista curta de aquisições.
Dei mais atenção aos pequenos pormenores, que de tão óbvios que podem interferir no desempenho:
Fazer o alinhamento polar o mais exacto possível - não vale a pena fazer um alinhamento polar à pressa. O buscador polar da em200 tem muito boa precisão, mas é fácil confundir os números quando se tem a cabeça ao nível do umbigo. Verificar e voltar a verificar. O alinhamento polar é de vital importância tanto para obter Go-Tos mais precisos, como para uma auto-guiamento com menos intervenções, que apesar corrigir a posição da estrela, não evita a rotação de campo por mau alinhamento, especialmente para alvos situados mais perto do pólo.
Apertar tudo muito bem. Esta é tão mais importante quanto os parafusos a apertar. Pequenos deslizes são suficientes para se estragar uma exposição. Não será propriamente uma tragédia em sub-exposições de 5 minutos, mas se acontecer numa de 20 ou 30 minutos será no mínimo irritante. Também é importante apertar bem os travões dos eixos da declinação e A.R.
Equilibrar com todo o equipamento já montado e com os cabos ligados. Desta nenhuma montagem está safa, independentemente do que custa. Equilibrar em declinação pode ser um verdadeiro quebra-cabeças, mesmo com os humildes 7 kg de carga que estou neste momento a montar.
De resto, os Go-Tos foram todos na "mouche", ou perto dela quando o erro acumulado de consecutivos Go-Tos já era grande. Cheguei entretanto à conclusão que não é realmente absolutamente necessário mais de 350x de velocidade de Go-To, que correspondem a 1,5 graus por segundo, que por sua equivalem 180 graus em dois minutos. Para ter velocidade 700x são necessários 24v que só se conseguem obter pondo em série duas baterias, que irei entretanto experimentar. O barulho destes motores fazem-me lembrar as brocas dos dentistas.
Tornou-se obrigatório arranjar uma solução para a energia, por muito que me custe ter que andar com baterias atrás, vou ter que usar duas baterias (por causa de possíveis interferências) com pelo menos 30-40 Ah de capacidade para alimentar ao longo de pelo menos 10-12 horas as (futuras) câmaras, os Kendrick, a montagem e o portátil.
Pátio 272 - Ocultação de Vénus
2008.12.01
Pátio (Leiria 39.75N 8.82W alt. 60m)
Durante toda a semana anterior, os ocasos têm sido enfeitados com duas luminárias que não passaram facilmente despercebidas: Vénus e Júpiter, às quais se juntou hoje o primeiro do "ranking", que num ataque de ciúmes se pôs durante quase 2 horas à frente do mais brilhante, Vénus.
Embora seja bem mais interessante quando a Lua se põe à frente do Sol, o espectáculo de hoje não deixou de ser extraordinário, tanto no binóculo, como à vista desarmada.
As nuvens impediram de observar o desaparecimento de Vénus no lado escuro da Lua (por 1 minuto!!!), só me restando ter mais sorte no reaparecimento. Vénus, com a vista desarmada, foi por alguns minutos um pequeno sinal bem luminoso indistinto da Lua. No binóculo 16x70, prontamente passou a ponto luminoso bem destacado, assemelhando-se a um pequeno Sol a subir no horizonte lunar, com uma fase a fazer lembrar um dente-de-alho.
Na animação acima o movimento está 10x acelerado, mostrando o movimento da Lua em relação a Vénus. Nas animações abaixo, além do reaparecimento de Vénus devido ao deslocamento da Lua, vê-se o movimento da Terra e o céu a começar a escurecer.